Ratos e Homens – John Steinbeck


As Vinhas da Ira é um dos meus livros preferidos, mas ainda não tinha dado oportunidade a outras obras de John Steinbeck, especialmente Ratos e Homens, que é um de seus maiores clássicos. Essa pequena novela escrita em 1937 conta uma história que se passa durante a Grande Depressão nos Estados Unidos e retrata dois trabalhadores rurais em busca da realização de um sonho. O título refere-se a um poema de Robert Burns sobre como os sonhos podem ser destruídos por forças exteriores, por mais que os homens (ou os ratos) se esforcem por eles.

O plano de George e Lennie é ganhar bastante dinheiro na fazenda em que irão trabalhar para que possam comprar um pedaço de terra. Na verdade é o sonho de quase todos os peões da fazenda, dependendo do grau que já atingiram de frustração e desilusão. Contudo, como estão numa realidade em que trabalham muito e só ganham o suficiente para gastarem no bordel mais barato da região, o grupo de trabalhadores dessa história há muito se conformou com seu catre para dormir e um caixote de frutas para guardar seus pertences. A ingenuidade de Lennie, no entanto, contamina George e eles acreditam que um dia será possível ser livre, fugir das amarras trabalhistas e viver da natureza, um dia de cada vez.

Por sua própria condição mental, o personagem Lennie é caricato e não evolui, mas ele faz um contraponto para que todos os outros personagens mostrem o que são, especialmente George, que se divide entre a raiva e a culpa, entre a vontade de se livrar de Lennie e o seu sentido de obrigação, entre sua liberdade e o medo de ficar sozinho. Nenhum personagem do livro, no entanto, escapa da solidão. O maior exemplo é Crooks, o estribeiro negro. Separado dos outros por questões raciais, ele é o mais solitário de todos e tem apenas livros como companhia, já que não pode ter contato com os brancos. Há um momento em que ele aproveita que Lennie não é capaz de entender ou julgar sua situação e o usa como ouvinte para um lindo discurso sobre a solidão.

A escrita de Steinbeck é bonita, especialmente em suas descrições da natureza e a passagem dos dias através da iluminação dos ambientes. A maior parte das ações se dão em interiores, basicamente no galpão dos peões ou no celeiro. Tudo que acontece fora desses lugares é descrito sempre do ponto de vista de quem está dentro, com exceção do início e do fim do livro, que se passam fora da fazenda. Não são descritos os momentos em que trabalham, mas aqueles em que jogam, conversam e sonham. Isso acaba dando uma sensação de peça de teatro, com personagens entrando e saindo, mas também serve para demonstrar como a liberdade deles era restrita. Um pequeno grande livro, que pode ser lido numa sentada, mas que preferi bebericar por alguns dias.

Adaptações
Justamente por ter essa característica de peça, a história foi adaptada muitas vezes para o teatro, bem como para a televisão e o cinema, e sempre serve de referência quando o assunto é solidão. Lembro que houve um episódio da série Lost (3.04), por exemplo, que usou citações do livro para convencer um personagem de que ninguém pode viver sozinho. Depois de ler, assisti a dois filmes baseados na obra: uma versão de 1939, de Lewis Milestone, e uma de 1992, dirigida e protagonizada por Gary Sinise, com John Malkovich como Lennie. Esta é praticamente uma refilmagem daquela e ambas são fiéis à história e são bons filmes, mas pra mim valeram mais como curiosidade. É possível ler o livro em menos tempo que assistir a qualquer um deles.

16 comentários sobre “Ratos e Homens – John Steinbeck

  1. Não lembro de detalhes do livro, mas quando o li na faculdade gostei bastante. Legal saber que foram feitas boas adaptações para o cinema.
    Em um episódio da terceira temporada de The Middle, Brick lê trechos desse livro (inclusive o final) em voz alta para o irmão mais velho (que era quem deveria ler a história para fazer um trabalho), dentro do carro, enquanto eles rodam desesperadamente à procura da jaqueta perdida da irmã. Inserido na cena, foi engraçado.
    bjo!

    1. Ah, que legal, Michelle! Nunca acompanhei The Middle direito, então não vi esse episódio. Acho que é um livro que todo americano tem que ler na escola, né? Acaba que sempre serve de referência em outras obras, tanto que eu já sabia mais ou menos como era o final. Bj! =)

  2. Oi, Lua! Poxa, a gente fica um tempinho sem visitar e quanta coisa perde! Vi que recebeu sua coleção da Folha, que falou sobre Um Copo de Cólera, etc. Passei para dizer que estou sem tempo de visitar seu espaço, que gosto muito, por conta da exposição que farei no início de julho! Estou pintando para dar conta da quantidade de telas que tenho que levar. Poxa, estou muito concentrado nisso e tudo ao redor ficou meio esquecido: música, cinema, blogs, etc. Somente a leitura que anda bem. Pelo menos isso! Bom, não esqueci o seu espaço! Beijos!

    1. Oi, Sandro! Já vi sua nova postagem sobre as telas, estão lindas! Tava aqui na lista “comentar com calma”. Obrigada pela atenção e carinho! Vou lá no seu blog agora. =) Bj!

  3. Lua, sempre quis ler esse livro. Já vi os filmes e achei bem interessantes, acredito muito que o livro deve ser melhor! Entrou para a lista 😉
    Beijos
    Tati

  4. Um dia vou ter que reassistir todo Lost pra pegar todas as referências literárias que eles usam…
    Seus posts sempre dão vontade de sair correndo pra comprar o livro e vir comentar aqui! Adoro as indicações!
    Bjuu

    1. Obrigada, Cah!!! Lembro que o Lost me deixou com uma lista de livros por ler, especialmente Dickens, do qual li quase nada. =)

  5. AVISO: COMENTÁRIO COM SPOILER
    Eu sempre me perguntei se George realmente era real nesse livro. a cena do estabulo quando Crooks pergunta para Lennie “voce e George andam sempre juntos nao eh?” Lennie se explica e tudo que Crooks diz ‘e “voce é louco… simplesmente louco” me deixou imaginando se George nao era simplesmente um figmento da mente perturbada de Lennie, talvez consequencia de tantos anos sozinho e sem ninguem. Sempre achaei que o propio Lennie se mata em vez de ter sido executado por George, mas nunca tive certeza

    1. AVISO: COMENTÁRIO COM SPOILER
      Olá, Davi! Olha só, acredito que não pois uma das coisas mais legais do livro é justamente o dilema de George, que é dividido entre o peso da amizade e a liberdade. O fato de todos se admirarem deles andarem juntos é justamente porque a condição dos trabalhadores é solitária e eles são uma exceção. Uma prova disso é o personagem do velho, que concorda em dividir seu dinheiro com eles – coisa que ele não faria se estivesse tratando apenas com uma pessoa com problemas mentais. Abraço! =)

  6. Oi Lua, vi a citação deste livro em outro livro que li “O Cheiro do Ralo” do Mutarelli, mas agora com sua resenha dando uma panorâmica no enredo, tive certeza de querer ler de fato este título.

    Aindo estou xeretando teu Blog e tenho certeza que ganharei novos títulos em minha estante com mais esta boa fonte de indicação de literatura.

    Hug

    1. Márcia, esse livro é bem legal, eu adoro Steinbeck, principalmente As Vinhas da Ira, que recomendo fortemente. Bj!

  7. Lua, sua resenha está muito, muito boa! =D
    Depois que terminei de ler o livro fiquei um bom tempo pensando na solidão daqueles personagens e na solidão que tantas pessoas enfrentam até hoje em trabalhos desumanos. A história é nos EUA, mas o tema é tão universal… Imagino que justamente por isso o livro seja um clássico.
    Confesso que nunca prestei muita atenção nos diálogos de Lost. Passava mais tempo imaginando qual seria a explicação para tudo aquilo. Mas agora fiquei curiosa…
    Beijo!
    P.S. Eu fiz uma resenha no início do ano, caso te interesse:
    http://maquiadanalivraria.blogspot.com.br/2014/01/ratos-e-homens-john-steinbeck.html

    1. Oi, Eduarda! Pois é, em Lost havia muitas referências literárias, dá até pra fazer uma listinha (lá vem eu pensando em um novo desafio, hehehe). Vou lá agora ver sua resenha. 😉

  8. Lua fiz uma leitura muito rápida desse livro, fiquei ansiosa em saber o que ia acontecer no final e ao ler sua resenha percebo que deixei algumas coisas passar, como o tal discurso sobre a solidão. Mas notei essa coisa da descrição do lugar, é como ele começa o livro e eu adoro descrições desse tipo.
    Nossa, não sabia dessas referências, comecei a ver The Middle e estava gostando muito, principalmente do garotinho. Já tinha ouvido falar que Lost é recheada de referências literárias, na época que assisti não prestei atenção.

    1. Gláucia, isso acontece muito comigo, às vezes deixo passar várias coisas em alguns livros por causa do momento da leitura, ou por não estar muito atenta etc. Mas no Lost realmente essa foi uma das referências mais explícitas, apesar de que só fui prestar mais atenção a ela depois que li o livro. =)

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